segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Aversão pela filosofia

Sabe-se que ao longo do tempo a filosofia atraiu para si indisfarçável antipatia. As razões não são facilmente identificáveis. Mas, quando despertamos nas pessoas o interesse por filosofia, o que era tácito torna-se explícito, e elas não conseguem evitar a rejeição que sentem por ela. Quase sempre consideram a filosofia enfadonha, sem utilidade e de difícil entendimento. De fato, ela não é utilitarista, não tende para o particular ou para o relativo, ela estima para si o saber sobre o todo, desconfia que o genuíno encontra-se encoberto na origem. Percebe desde os primórdios que a ignorância é uma latência transitória, algo a ser desvendado.

O que talvez deixe a filosofia chata ou cansativa é a metodologia por ela adotada durante o processo dialético e argumentativo – o filosofar autêntico – competência desenvolvida pelos primeiros pensadores para realizar a justificação racional. Por sua vez, a ignorância é superada na medida em que cada etapa desse processo argumentativo avança e se expande. Portanto, o conhecimento resultante é uma atividade da razão pura, definitivamente desmistificada pelos gregos.

Já na idade média, a razão é interpelada arbitrariamente pela fé, que gera o dogma e, com ele, surge o sortilégio nefasto que interrompe a caminhada dialética, cerceando a liberdade da razão, instaurando no homem o instinto de rebanho. Dessa forma, o livre pensar perde a autonomia para a fé e a razão se deixa subjugar pela dogmática instituída. Desde então, vagamos e divagamos, não se sabe ao certo. Sabe-se apenas que sucumbimos e desaprendemos a pensar. Prisioneiros dos círculos concêntricos do mero existir, perambulando, perdemos a capacidade de pensar verticalmente. Hoje somos homens vivendo na horizontalidade. Será isso de fato o que somos?

A filosofia pode devolver a cada um de nós a autoestima suplantada pela dogmática histórica. Pode nos ajudar a resgatar a plena capacidade da razão livre e pensar sem o medo e o dogma das doutrinas. No entanto, o homem contemporâneo, que apenas se move sob a pressão dos círculos existenciais, ainda deixa-se arrastar pela força de doutrinas combalidas e corroídas pelo tempo. Não querendo se libertar, preserva em si mesmo indícios de um primitivismo incontestável e pouco evoluído. O que deveria tê-lo humanizado não o fez, mas mesmo assim, não o liberta e nem o deixa prosseguir.

O homem do senso comum pensa que a filosofia atua sobre o imponderável e julga o ato filosofante como devaneio ou perda de tempo. Filosofar não é divagar, é a busca pelo ponderável desconhecido, é um ato livre do puro pensamento. Pena que ainda não fomos suficientemente adestrados para o ato filosofante puro, tão necessário e indispensável para a nossa humanização. 

Nenhum comentário: